quinta-feira, 11 de junho de 2009

Escolaridade obrigatória?

Não tenho acompanhado as últimas notícias sobre o tema (nem sei se houveram novos desenvolvimentos desde então), mas quando o Sr. Eng. Sócrates anunciou no congresso do PS, a intenção de tornar a escolaridade obrigatória até ao 12º ano, e disse que a maneira de o conseguir será através da concessão de bolsas de estudo aos alunos mais pobres com idade compreendidas entre os 15 e os 18 anos de idade, fiquei um tanto assustada.
Isto porque, ao reflectir sobre o actual sistema de ensino, chego à conclusão de que muito chão temos para andar antes de complicarmos as coisas ainda mais.
Ora vejamos: o ensino pré-escolar anda na corda bamba, e os alunos que o frequentam vão pouco ou nada preparados para o ensino primário; este tem regras cujo entendimento ultrapassam os limites do razoável (com alunos que concluem o 1º ano sem saber ler nem escrever - porque não tiveram grande preparação ou outra qualquer razão - e passam para o 2º ano - só para acompanhar o grupo turma - onde vão enfrentar uma classe que está a aprender conteúdos que eles nem sonham existir, e onde o(a) professor(a) não lhes vai dar a atenção necessária - nem a que certamente gostaria, dificultando ainda mais a sua aprendizagem); o ensino a nível do 2º ciclo, do 3º e do secundário também apresenta as suas lacunas, com a possibilidade de passar alunos com notas negativas a várias disciplinas importantes; e o ensino superior acabou de sofrer modificações severas, sendo encurtado (talvez um dia eu ainda comente isso aqui). Isto para não falar das taxas de insucesso e de abandono escolar, e dos problemas entre os professores de todos os níveis de ensino e as suas respectivas tutelas.
Apesar de concordar que o acesso à escola pode vir a ser uma possibilidade de distinção entre as pessoas, uma forma de proporcionar aos jovens maiores recursos pessoais e profissionais (socialização, conhecimentos etc.), de forma a ajudá-los a enfrentar de maneira mais eficaz o mundo que os rodeia, não posso deixar de ficar preocupada com a ideia de se "obrigar" esses mesmos jovens a fazerem algo que não querem.
Até porque, ninguém pode ser obrigado a aprender (princípio básico de qualquer lição de pedagogia). E, creio eu, mais relevante do que ser obrigado a frequentar a escola até aos 18 anos de idade, é aprender enquanto se frequenta a escola, já que a ideia central da frequência escolar não é apenas "andar por lá", mas sim adquirir os conhecimentos considerados adequados a cada ciclo de estudos.
Obrigar quem não quer estudar a frequentar a escola até aos 18 anos de idade é, talvez (e sem exagero), uma forma de introduzir no ambiente escolar mais tristeza, mais mágoa, falta de disciplina e, até, violência (como se não bastasse a que já temos).
Jovens com 16, 17 e 18 anos que não querem estudar deveriam ser incentivados a trabalhar, e oferecer-lhes uma bolsa de estudo para fazerem o que não gostam parece-me constituir-se numa ofensa aos que querem estudar e esforçam-se para isso, apesar das muitas dificuldades que também possam enfrentar.
Pena que no meio de tudo isso, o que conte mesmo sejam os números: a redução do índice de desempregados no país (se esses jovens que não querem estudar estiverem a frequentar o ensino já não serão desempregados), o aumento da taxa de conclusão do secundário, entre outros.
Para mim, o certo seria investir na qualidade das escolas e no acesso a elas, ao mesmo tempo que se criam as condições para que as famílias e os jovens percebam a importância da educação e nela invistam. Demora mais tempo, mas obtém-se os mesmos desejados números. Tenho a certeza!

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Tempo de barulho

Nem sempre o que dizemos encerra o que queremos dizer. Na verdade, e a mais das vezes, o que não dizemos (ou o que calamos) reflecte muito do que queremos expressar.
De facto, para opinar não é necessário chamar a atenção de tudo e de todos em voz alta.
Não estou a falar de opiniões gratuitas (do tipo falar só para não ficar calado), mas de opiniões reflectidas, com conhecimento. Estou a falar de opiniões sobre os acontecimentos que, directa ou indirectamente, afectam o nosso dia-a-dia e ajudam a mudar o rumo da nossa "caminhada".
Sendo assim, será o barulho o oposto do silêncio? Não creio... Até porque há imenso barulho no silêncio!
Uma das coisas fantásticas da suposta democracia em que vivemos é a liberdade de expressão. Através desse direito podemos exercer o nosso dever de participar activamente da nossa sociedade.
Mas será que o fazemos com consciência e em prol de valores realmente importantes? Será que as nossas opiniões estão a ajudar a construir e a fazer alguma diferença à nossa volta?

domingo, 31 de maio de 2009

Tempo de silêncio

Pois é, pessoal... andei "desaparecida" por uns tempos. Três meses de ausênica, mas finalmente estou de volta.
Mas não me vou pôr aqui com justificações para o meu silêncio prolongado, não se preocupem. Apenas digo que, às vezes, é necessário um pequeno afastamento para reorganizar as coisas (ideias, sonhos, vida...).
Mas pronto! Já estou de volta! E desta vez, espero, para ficar...

domingo, 1 de março de 2009

Malba Tahan

Remexendo as minhas memórias de infância, lembrei-me do tempo em que vivemos no Recife, lá pelos meus 12 anos. A nossa casa tinha uma grande biblioteca, que cobria três paredes (do chão ao teto) do escritório do meu pai, onde eu costumava passar horas e horas a “devorar” livros.
Havia uma colecção de capa dura, da qual nunca me esquecerei. Eram livros de Malba Tahan, pseudónimo de Júlio César de Melo e Sousa, que nasceu no Rio de Janeiro, a 6 de Maio de 1895, e faleceu no Recife, a 18 de Junho de 1974.
Além de escritor, Júlio César (ou Malba Tahan) foi também matemático. O livro dele que mais me marcou foi O Homem que Calculava, um romance premiado pela Academia Brasileira de Letras, que já ultrapassou a 45ª edição, vendeu mais de dois milhões de exemplares, e foi traduzido para o alemão, inglês (nos Estados Unidos e na Inglaterra), italiano, espanhol e catalão, sendo indicado como livro paradidáctico em vários países, citado pela Revista Book Report, e em várias publicações do género. Narra as aventuras e proezas matemáticas de um calculista persa na Bagdad do século XIII.
É engraçado como, muitas vezes, o presente não é um preditor linear do futuro. Se assim o fosse, poder-se-ia dizer que Júlio César nunca seria escritor, e muito menos matemático.
Ora vejamos, aos dez anos de idade, foi enviado pelo pai ao Rio de Janeiro (a família residia em Queluz, interior de São Paulo), onde se deveria preparar para o Colégio Militar. Coube ao seu irmão, João Batista, por ser o mais velho, a tarefa de o orientar e, mais que isso, fazê-lo estudar. Preocupado, João Batista escreveu certa vez ao pai, informando sobre o irmão:
– Não sei como o Julinho se vai sair no exame: escreve mal, e é uma negação a matemática.
Contrariando as previsões pessimistas do irmão, Júlio César ingressou no Colégio Militar em 1906, e ali permaneceu até 1909, quando se transferiu para o Colégio Pedro II, onde não foi um bom aluno a matemática, chegando a tirar um dois (em 10 valores) a álgebra, e cinco numa prova de aritmética. Criticava veementemente a didáctica da época, que classificava como um "detestável método de salivação".
Vocacionado para o magistério, concluiu o curso de professor primário na Escola Normal do Rio de Janeiro e, depois, diplomou-se em Engenharia Civil pela Escola Politécnica, em 1913.
Iniciou as suas actividades profissionais como servente e auxiliar interino da Biblioteca Nacional, privilegiada oportunidade de conviver com milhares de livros. A sua carreira de professor começou nas turmas suplementares do Externato do Colégio Pedro II. Depois, assumiu a docência na Escola Normal, leccionou para menores carentes, e tornou-se catedrático do Colégio Pedro II, do Instituto de Educação, da Escola Normal da Universidade do Brasil e da Faculdade Nacional de Educação, onde recebeu o título de Prof. Emérito.
Nas aulas, trabalhava com estudo dirigido, manipulação de objectos e propôs a criação de laboratórios de matemática em todas as escolas.
Em 1919, depois de tentar inutilmente publicar alguns artigos seus no jornal O Imparcial, onde trabalhava, Júlio César convenceu o editor a publicar os artigos de um certo R. S. Slade que, segundo ele, estava fazendo enorme sucesso nos Estados Unidos. O primeiro de todos os artigos publicados com o pseudónimo R. S. Slade foi A vingança do Judeu.
Entre 1918 e 1925, Júlio César estudou árabe, leu o Talmude e o Corão, estudou História e Geografia do Oriente e, combinado com Irineu Marinho, do jornal A Noite, inventou o personagem Ali Iezid Izz-Eduim Ibn Salim Hank Malba Tahan, tendo inclusive criado uma biografia para ele. O personagem fictício, que assinaria os seus livros a partir dali, nasceu em 1885 na Arábia Saudita, e bastante jovem foi prefeito de El Medina. Com a herança do pai, Tahan ficou riquíssimo e viajou por vários países como a Rússia, a Índia e o Japão, morrendo em 1921, na luta pela libertação de uma tribo na Arábia Central. Para maior verosimilhança foi criado também um "tradutor" para a obra de Tahan, o professor Breno de Alencar Bianco. O jornal começou a publicação dos Contos de Malba Tahan, com a biografia do suposto autor.
O nome Tahan foi tirado do sobrenome de uma de suas alunas (Maria Zachsuk Tahan) e significa moleiro. O nome Malba significaria oásis. A mudança de nome tornou-o tão famoso que o presidente Getúlio Vargas o autorizou a usar o nome Malba Tahan na sua cédula de identidade.
Júlio César só saiu do Brasil para visitar Lisboa, Montevideu e Buenos Aires. Jamais esteve no Oriente. Nunca viu um deserto.
Com o pseudónimo de Malba Tahan, e com o seu nome verdadeiro, publicou cerca de 120 livros. Sua obra é bastante diversificada: trata de matemática, didáctica, romance, contos orientais, contos infantis, teatro, contos morais-religiosos, temas brasileiros etc. Segundo a sua biografia, o seu livro preferido era A Sombra do Arco-Íris, mas eu recomendo a leitura de todos!

sábado, 28 de fevereiro de 2009

Visita poética

Noutro dia, recebi (ou melhor, o blogue recebeu) a visita de um poeta (José António Cavalcanti) lá do outro lado do oceano. Não o conheço, nem aos seus escritos, mas retribuí a visita (e a simpatia), e encontrei algumas coisas interessantes:

Porque te amo?
Não há respostas.
Meu amor é um míssil.
Secreta ogiva segreda
inaudíveis palavras de amor.
Infelizmente
você não acciona o controle remoto.
Disparo meu último foguete.
Acciono o pavio,
porém você não detona.
Então, amor, afundo
e não volto à tona.

Para Creuza
(...)
O poema pode não mudar o mundo,
mas ilumina o caminho do homem.

Nau sem rumo
Não preciso de cartas de navegação:
basta-me o sonho de travessias impossíveis.
(...)

Acho que vale a pena conferir:

domingo, 22 de fevereiro de 2009

Rachel Getting Married

Pelos vistos estou numa fase “cinema”, porque o grande ecrã tem atraído bastante a minha atenção ultimamente.
Ontem à noite fui com o meu filhote ver O Casamento de Rachel. Ele não gostou, mas eu não sou da mesma opinião.
O Casamento de Rachel” é um drama dirigido por Jonathan Demme (de O Silêncio dos Inocentes), gravado com uma aparência de filme independente, como se o espectador lá estivesse de câmera na mão. A trilha sonora vem dos músicos que ensaiam para o casamento que dá nome ao filme.
O enredo mostra Kym (Anne Hathaway, que está simplesmente brilhante e verdadeira na sua actuação), uma jovem toxicodependente, que consegue uma dispensa do seu internamento clínico, para assistir ao casamento da irmã. À chegada, encontra uma recepção ríspida, carregada de fantasmas do passado.
Repleto de traumas e conflitos familiares, o filme mostra uma família que se ama e se odeia ao mesmo tempo, mas com capacidade para superar os seus problemas em benefício de todos.
Não se pode dizer que seja o filme do ano (certamente não é para todos os gostos), mas, não sendo original na trama, acaba por prender a atenção, ao mostrar a dificuldade de amar e de ser amado, de pedir desculpas e de perdoar, de conviver com fraquezas e frustrações e seguir em frente, apesar disso.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Quem quer ser bilionário?

Hoje fui sozinha ao cinema! Nunca tinha feito isso, mas todas as pessoas que eu conheço (e que me poderiam acompanhar) já tinham visto o filme que eu queria, então lá fui eu, após o trabalho. Para não variar, como a sessão era cedo (fui à das 17h10), a sala estava quase vazia (havia somente um casal além de mim). Comprei a minha pipoquinha e o meu Sumol de laranja (que eu não gosto, mas eles não vendem nada melhor), e me instalei numa cadeira qualquer (tinha muito por onde escolher).
Fui ver o “Quem quer ser bilionário?” (título português) ou "Slumdog Millionaire" (título original), de Danny Boyle.
O filme conta a história de Jamal Malik, um órfão de 18 anos dos subúrbios de Mumbai que, apenas a uma pergunta de ganhar os incríveis vinte milhões de rupias (cerca de 300 mil euros) da versão indiana do concurso “Quem quer ser milionário”, é denunciado à polícia pelo apresentador do programa, por suspeita de fraude. Na esquadra, Jamal conta à polícia a história da sua vida nas ruas, e as suas aventuras para reencontrar a rapariga que ama desde criança.
Jamal vive uma vida simples, é honesto e íntegro numa Índia violenta e infernal, onde os maus-tratos a menores são o prato do dia de bandidos sem escrúpulos que dominam a cidade (qualquer semelhança com outras realidades de outros países... não é mera coincidência).
No entanto, Jamal não se interessa por dinheiro. Então, o que estará a fazer no programa? E como consegue acertar tudo, se não tem estudos? Será o destino?
Achei incrivelmente fantástico este enredo, que demonstra como o ser humano consegue captar (e perceber) o mundo à sua volta, a maneira como pode aprender (e como pode sofrer para o fazer) e, finalmente, para que serve esta aprendizagem (que não depende, necessariamente, da escola formal, mas da escola da vida). Eu recomendo!

sábado, 14 de fevereiro de 2009

A Troca

No último fim-de-semana fui a Lisboa e aproveitei para ir ao cinema com o meu filhote. Fomos ver um filme que ainda não havia chegado a Viseu: A Troca, realizado por Clint Eastwood, e com Angelina Jolie como actriz principal. Narra a história verídica de uma mãe que se despede do filho antes de ir para o trabalho e, na volta, descobre que a criança desapareceu. A mãe desesperada inicia, então, uma busca imparável, enfrentando polícias corruptos e um sistema que tenta, a todo o custo, calar a sua voz. Um filme íntegro, tecnicamente bem realizado, uma história chocante, mas, apesar das passagens fortes que em outra película poderiam causar lágrimas, nesta provoca pouca emoção. De qualquer forma, valeu o tempo gasto!

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

O adolescente míope

Adolescência... Quem não se lembra da sua? Confusão, descoberta, emoções, preocupações... Seja como for, cada um tem uma história, a sua história, um percurso interessante e, certamente, digno de ser narrado.
Hoje presenciei uma narrativa de alguns percursos adolescentes. Poderiam ser os percursos de qualquer um, mas era o do bailarino e coreógrafo romeno, Romulus Neagu, o do actor e encenador inglês, Graeme Pulleyn, e o do músico e compositor português, Luís Pedro Madeira. Com música interpretada ao vivo, o espectáculo "A partir do adolescente míope", que estreou no Teatro Viriato, em Viseu, constrói-se em volta da misteriosa relação entre o ser humano e o livro, o acto de escrever, o prazer de ler e a obrigação de estudar.
Trata-se de um olhar e de um reviver das adolescências dos artistas, com base no encontro entre a reflexão pessoal e a (re)descoberta da obra literária O Romance do Adolescente Míope, de Mircea Eliade, um jovem autor que escreveu o seu primeiro romance aos 17 anos.
Num cenário simples e solitário, o espectáculo concentra-se, sobretudo, na necessidade de cada um procurar a sua voz, descobrir o que precisa de dizer e como consegue dizer (através dos livros, da dança, do teatro, da música, da ciência, do desporto etc.). E esse "grupo" soube dizer muito bem. Eles cantam, dançam, correm, discutem, leem... mas principalmente, transmitem as suas histórias de uma forma muito particular.
Deixo aqui o meu agradecimento ao Romulus, que teve a gentileza de me convidar para o ver mais uma vez em palco. Amei!!!

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Pomba-Gira

No início do mês postei o meu desacordo com o Acordo Ortográfico, e falei das expressões regionais que nunca poderão ser iguais, visto fazerem parte da identidade de cada povo. Expliquei que é isso que faz a diferença entre o português falado no Brasil e o português de Portugal, e não uma meia dúzia de palavras escritas de forma diferente.
Sábado passado estive a apresentar uma comunicação no Congresso Luso-Brasileiro de Psicologia da Saúde, em Faro, no Algarve, e vi uma cena caricata e engraçada que não podia deixar de relatar aqui, visto ilustrar perfeitamente o que eu disse anteriormente.
Estava um grupo de meninas pertencentes à organização do congresso (aquelas pessoas que apoiam o funcionamento de cada mesa, ligam os computadores, verificam se está tudo a correr bem) sentado num dos corredores de acesso às salas, quando o coordenador de uma das mesas aproximou-se delas.
Era um senhor brasileiro com os seus 50 e tal anos, bastante simpático, que foi prontamente aclamado por todas as meninas com muito entusiasmo (uma delas até, em tom de acolhimento, cantou: “olha que coisa mais linda, mais cheia de graça...”). Ele, não querendo ficar para trás nos elogios, retrucou: “Aqui estão as minhas belas periquitinhas!”
Elas estavam visivelmente divertidas com a conversa e, para ajudar à festa, começaram a dizer que eram umas pombinhas. Visto o assunto caminhar para o quesito “beleza”, completaram: “somos umas pombinhas giras” (para quem não está familiarizado com a palavra, gira, em Portugal, significa bonita). O brasileiro sai-se, então, com a seguinte frase: “Pombas-Giras, não! Deus me livre!” – e afastou-se lentamente do grupo.
É que Pomba-Gira, no Brasil, é um Exu-Fémea (espírito que se incorpora nos médiuns, uma entidade que trabalha na Umbanda). A Umbanda é uma crença formada dentro da cultura religiosa brasileira, que reúne vários elementos, inclusive de outras religiões como o catolicismo, o espiritismo e religiões afro-brasileiras.
Para o grupo todo, ficou um mal-entendido ou um não-entendido, que levaria algum tempo para ser explicado. Elas ficaram sem perceber o “Deus me livre” do senhor... e ele, certamente, não entendeu o “Pombas-Giras” proferido pelas raparigas.
Para mim, que assistia a cena de fora, foi uma situação interessantíssima. Simplesmente demais!
Acham que dá para uniformizar isso? Impossível! E viva a diferença!

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Meu vício, o Café

Noutro dia, num jogo quebra-gelo feito num workshop em que participei, pediram-nos que nos apresentássemos, dizendo o nome, a profissão, o signo e um vício. Assim, de repente, pensar (e confessar) um vício, não é fácil, e acabei por dizer “café”, mas pensando bem, posso dizer que é mesmo. Constantemente perco a conta do número de cafés diários que bebo, e o efeito sentido resume-se a um só: prazer!
No Brasil, eu costumava beber café de saco (aquele coado). A quantidade também era grande, mas há uma diferença entre lá e cá. Em Portugal, quando se pede um café, servem-nos sempre o café expresso (ou bica, como também é conhecido), bem mais forte e encorpado.
Assim, e desde que saí do “meu país”, adquiri o hábito do expresso de manhã, a seguir ao almoço, a seguir ao jantar, a meio da tarde, ao fim da tarde (etc., etc.), ainda em Moçambique, naqueles vários cafés espalhados pela Av. 24 de Julho, onde eu me obrigava a parar sempre que podia.
É engraçada essa coisa do hábito. Uma vez adquirido, sentimos falta quando não encontramos do mesmo.
Agora já não aprecio, infelizmente, o café servido no Brasil (excepto o que bebo em casa da minha mãe, claro!). Em Espanha, se se quer beber um bom expresso... bem, ainda não encontrei um bom expresso em Espanha porque, invariavelmente, o que nos servem por lá é uma “banheira” de água com um pó preto. Em França, dentro do meu francês inexistente, aprendi a pedir um expresso “très serré” para ter qualquer coisa parecida com a bica portuguesa, do contrário, também receberia uma banheira (caríssima, por sinal) de água e pó preto.
Por falar em bica, esse termo é a inicial da expressão "Beber Isto Com Açúcar", tendo surgido em Lisboa, quando o café expresso começou a ser comercializado, num café localizado no Chiado, denominado "A Brasileira". Ocorreu que o sabor do café era pouco agradável ao paladar, uma vez que os lisboetas não misturavam açúcar ao preparado, pelo que foi criado o slogan Beber Isto Com Açúcar, para os esclarecer. O termo teve tanto sucesso, que acabou por ficar até aos nossos dias.
Por outro lado, no Porto, o costume é pedir um cimbalino, como referência a La Cimbali, uma popular marca de máquinas de fazer café expresso.
Expresso, Bica, Cimbalino, ou somente Café (seja como for), assumo publicamente: é um "vício" bem bom!

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Saudades de Moçambique

Falar do Mia Couto fez-me lembrar dos belos (embora poucos) anos que passei em África. Foram poucos, mas bons, como se costuma dizer.
Por incrível que pareça, não fui para lá com grandes expectativas. Achava mesmo que não ia gostar nada daquilo (afinal, o Oceano Índico não tem a cor do Atlântico) mas, felizmente, tudo correu diferente do que eu supunha e... amei!
De facto, África será sempre África! E o que quer isso dizer? Quer dizer que aquela terra será sempre boa, será sempre bela, será sempre acolhedora. E como me acolheu bem!
Aquele povo é simples, humilde, feliz... de tal forma, que às vezes indagamos: “como podem ser felizes com tanta pobreza, com tanta miséria?”. E a resposta está bem à vista e é tão óbvia (principalmente para alguém que veio do Brasil) que até nos envergonhamos da pergunta: é simplesmente porque o verdadeiro tesouro, a verdadeira riqueza, não está nos valores materiais e nos bens que um povo possui... está nas lições que ele sabe ensinar. E a África “sabe” disso...

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Mia Couto

Tal como prometido no post anterior, hoje vou falar do Mia.
António Emílio Leite Couto, um dos escritores moçambicanos mais conhecidos no estrangeiro, nasceu na Beira, em 1955. Ganhou o nome Mia do irmão mais novo, que não conseguia dizer Emílio. “Reza a lenda” que o escritor adoptou esta alcunha também devido a sua paixão pelos gatos desde pequeno, tendo inclusive dito à sua família que gostaria de ser um deles (verdade ou não, quem gosta de gatos, tem a minha admiração!).
Segundo a sua biografia, Mia teria dito certa vez que não tinha uma “terra-mãe”, mas sim uma “água-mãe”. Referia-se à tendência para a sua terra natal, situada à beira do Oceano Índico, ficar inundada durante a época das chuvas.
Mia Couto iniciou o curso de Medicina ao mesmo tempo que começava a fazer jornalismo, tendo abandonado aquele curso para se dedicar à profissão. Foi director da Agência de Informação de Moçambique e, mais tarde, tirou o curso de Biologia.
Vencedor de vários prémios, tem a sua obra traduzida em alemão, espanhol, francês, inglês, italiano, neerlandês, norueguês e sueco.
Pessoalmente, a sua simpatia, humildade e simplicidade não deixam as pessoas indiferentes.
No dia 7 de Março de 2005, fez uma oração de sapiência, na abertura do ano lectivo do Instituto Superior de Ciências e Tecnologia de Moçambique. Do texto, destaca-se a mensagem “Os Sete Sapatos Sujos”, que transcrevo pela beleza da lição:
“Não podemos entrar na modernidade com o actual fardo de preconceitos. À porta da modernidade precisamos de nos descalçar. Eu contei ‘Sete Sapatos Sujos’ que necessitamos de deixar na soleira da porta dos tempos novos. Haverá muitos. Mas eu tinha que escolher, e sete é um número mágico:
Primeiro – A ideia de que os culpados são sempre os outros e nós somos sempre vítimas;
Segundo – A ideia de que o sucesso não nasce do trabalho;
Terceiro – O preconceito de que quem critica é um inimigo;
Quarto – A ideia de que mudar as palavras muda a realidade;
Quinto – A vergonha de ser pobre e o culto das aparências;
Sexto – A passividade perante a injustiça;
Sétimo – A ideia de que, para sermos modernos, temos que imitar os outros.”

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

O outro pé da sereia

Como gosto de partilhar o que faço e o que me encanta com os amigos, volto a falar de literatura. Estou a acabar de ler mais uma obra de Mia Couto (noutro dia falo melhor sobre ele aqui): O outro pé da sereia.
Este romance narra várias viagens, entre elas a de um missionário português que pretende converter o continente africano, a de uma jovem que quer regressar à infância e a de um casal de afro-americanos que busca um lugar encantado. Numa mistura entre presente e passado, mais uma vez o meu escritor africano favorito prende a atenção do leitor com uma história encantadora, cheia de sonhos e de realidades, repleta de lições (históricas, sócio-políticas, de vida).
Deixo dois trechos interessantes (para aguçar a vossa vontade de ler):
“A melhor maneira de fugir é ficar parado. Lição que o burriqueiro Zero Madzero aprendera com a imbabala, a gazela dos matos densos. É a fuga da presa que engrandece o caçador. O ficar imóvel é o mais astuto modo de enfrentar o predador: deixar de ter dimensão, converter-se em areia no deserto. Desaparecer para fazer o outro extinguir-se.
A melhor maneira de mentir é ficar calado. Lição que o burriqueiro não aprendera com ninguém. O silêncio não é ausência de fala, é o dizer-se tudo sem nenhuma palavra.” (p. 20)
“Os outros passam a escrita a limpo. Eu passo a escrita a sujo. Como os rios que se lavam em encardidas águas. Os outros têm caligrafia, eu tenho sotaque. O sotaque da terra.” (Epígrafe do capítulo XVI, p.271)

domingo, 1 de fevereiro de 2009

(Des)acordo!

Fala-se muito (mais ainda desde o ano passado) sobre a Nova (Velha) Reforma Ortográfica, mas ainda não percebi as vantagens disso. Aliás, acho que ninguém percebeu. Talvez porque ninguém até agora tenha dado uma explicação plausível para se gastar tempo com uma coisa que não está estragada e que, portanto, não necessita de reforma alguma. Mas tudo bem... Parece que no Brasil a coisa vai pegar mais rápido que cá, mas tudo indica que, no final, Portugal também vai aderir ao Acordo.
Ponham-se na minha situação! Vim para fora do Brasil há mais de dez anos, vivendo sempre em países que falam o português e, durante esse tempo, tive que mudar a grafia que utilizava (ato, fato, contato, adotar, ótimo, idéia, correto, objeção, direção, objetivo, afeto, entre outras palavras), passando a escrever de outra forma (acto, facto, contacto, adoptar, óptimo, ideia, correcto, objecção, direcção, objectivo, afecto). Não foi fácil adaptar, além de ter sido um processo moroso. Agora, sem mais nem menos, querem que eu volte a escrever como dantes? Ora essa... era o que faltava!
Falando mais a sério (e dificuldades particulares à parte), na minha opinião, o Acordo é totalmente inútil! Trará custos que acabarão por ser bem superiores aos benefícios (se é que os há). Gramáticas novas, dicionários novos, livros novos... e para quê?
Aparentemente, tudo foi elaborado em nome de uma suposta unificação. Unificação esta, completamente desnecessária, já que a essência da língua está (e continuará a estar) toda lá, quer se adopte (ou quer se adote) ou não, uma nova grafia. Não há alterações nisso, na essência. E, no fundo, é isso que interessa.
Ler um texto escrito em português do Brasil ou em português de Portugal será sempre igual, visto que os regionalismos continuarão a existir, a utilização do gerúndio será sempre maior lá que cá, a concordância e a aplicação do pronome continuarão diferentes.
O mercado editorial de ambos os países nunca esteve em baixo por causa dessas pequenas diferenças, pois um livro publicado em Portugal sempre pôde ser vendido no Brasil (o meu o é, por exemplo), e vice-versa.
As diferenças que, eventualmente, poderão causar alguma dificuldade na interpretação, são as de ordem vocabular, nunca de grafia. Muitas palavras que no Brasil e em Portugal têm significados diferentes, permanecerão no vocabulário de cada país depois de entrar em vigor o Acordo (por exemplo: rotatória e rotunda; celular e telemóvel; presunto e fiambre; terno e fato; água sanitária e lixívia; pedestre e peão; aposentado e reformado; camisola e camisa de noite; calcinha e cueca; e várias outras). Então para que complicar?!
Por mais que eu procure, não encontro mesmo qualquer justificação para essas mudanças de grafia. Em nome de uma unificação, o que se vai fazer é criar instabilidade, sem se conseguir unificar nada. Defende-se que “apenas” 0,43% do vocabulário brasileiro, e 1,42% do português, serão afectados. A meu ver, não se trata de quantidade, mas de qualidade. O que interessa é que essa inconsequência (ou inconseqüência) vai causar mais confusão do que se imagina (na minha humilde opinião, claro!).

sábado, 31 de janeiro de 2009

Me gusta

Na última quarta-feira, fui ao teatro! A acompanhar-me, foram o Khalid e a Margarida (e lá no bar do teatro ainda encontramos a Cristina).
Me gusta, da companhia belga Laika, o espectáculo escolhido para aquela noite, estava em cartaz no Teatro Viriato, em Viseu. Foi uma interessante aventura cultural (e culinária), repleta de surpresas, e com um repertório musical a condizer.
Para o compor, foram realizadas entrevistas, que recolheram ideias sobre as diferentes práticas culinárias, os diferentes costumes, os diferentes rituais, as diferentes tradições, que fazem do acto de comer um acto social, importante em qualquer cultura.
Assim, foi abordado, num cenário oval com a plateia sentada no palco, vários aspectos da gastronomia de povos de diversas partes do mundo, oscilando entre o rigor e a exuberância, o formal e o exótico (uma cerimónia de chá japonesa, um banquete canibalesco, a comida rápida e plastificada servida nos aviões, o amassar do pão, a pasta italiana, o uso do sal e do açúcar), tudo precedido de um ritual de lavagem de mãos efectuado pelos artistas a cada pessoa da plateia.
O enredo, repleto de instruções sobre o bem comer, o bem provar e o bem saborear, conta com a participação de três actores, uma bailarina e dois cozinheiros, e está adaptado a cada língua dos diferentes países onde a companhia se apresenta.
Durante a encenação, é servido um jantar completo composto por uma sopa, um prato de massa e a sobremesa, aos quais também se junta o vinho.
Devo dizer, no entanto, que o final ficou a saber a pouco. Não sei... esperava qualquer coisa a mais para fechar com chave de oiro! De qualquer maneira, foi uma forma divertida e interessante de passar a noite. Jantar e ir ao teatro ao mesmo tempo pela módica quantia de 15,00€, não é coisa que se faça todos as noites.
E porque a mim "me gustó", digo a vocês que vale a pena experimentar!

domingo, 25 de janeiro de 2009

Agora são os filmes

Actualmente, não sei porquê, entrei numa de fazer balanços... Não tentem interpretar isso, pois a psicóloga aqui sou eu, e digo que não há nada para interpretar.
Verdade! A explicação até é simples. Tudo começou com a tal crise económica... Comecei por apontar as despesas grandes, passei às pequenas contas e, quando dei por mim, já estava a contabilizar lugares, espectáculos, musicais, enfim. Também parece ser uma forma diferente de passar o tempo (tal como escrever num blogue).
Bem, agora virei-me para o cinema. Não sou cinéfila, mas gosto de um bom filme, e aprecio a distracção e a riqueza (cultural, moral, espiritual etc.) que um bom enredo pode trazer. De há uns tempos para cá, mudei o género diversas vezes. Gostava de dramas, de filmes românticos; depois passei aos filmes de aventura; a seguir vieram as comédias; e por fim, nesse preciso momento da minha vida, gosto de filmes bons, que me atraiam na leitura da sinopse.
Já que a ideia é fazer balanço, não vou maçar-vos com os filmes do ano passado, mas vou falar dos dois que vi em 2009, que estão fresquinhos, fresquinhos na memória (e que recomendo).
O primeiro, assisti em vídeo, porque é uma produção que estreou nos cinemas em 2005. Chama-se Colisão, e lança um olhar directo e provocador sobre as complexidades da (in)tolerância racial na América actual. A maioria das personagens retratadas no filme são, de alguma maneira, prejudicadas pela sua etnia ou nível social, e acabam envolvidas em conflitos que as forçam a examinarem os seus próprios preconceitos. O filme não deixa as pessoas indiferentes diante da sua imprevisibilidade e ausência de julgamentos, ainda que não totalmente isento de uma moral subjacente a qualquer história cinematográfica, e que é traduzida (também) na frase de uma das personagens: "Pensas que sabes quem és? Não fazes a mínima ideia!".
No filme, cerca de vinte personagens interpretadas por um excelente elenco (uma dona de casa e o seu marido, advogado estatal; um persa, dono de uma loja, a sua mulher e a sua filha, que é médica; dois polícias detectives, que são também amantes, a mãe dele; um director de televisão afro-americano e a sua mulher; um mexicano serralheiro, com mulher e uma filha pequena; dois ladrões de automóveis, um polícia recruta e outro veterano, cujo pai está doente; uma funcionária da Segurança Social; um casal coreano de meia-idade), vivem em Los Angeles e, durante 36 horas, entram em colisão. Colisão no sentido do toque, já que nesta cidade, sente-se a falta do toque, do conhecimento, do contacto com os outros. Como eu disse: vale a pena ver!
O outro filme, vi no cinema na semana passada. Chama-se O Estranho Caso de Benjamin Button, e fala sobre a impossibilidade de parar o tempo, sobre os encontros e desencontros da vida, sobre aproveitar os momentos, sobre o início e o fim. Começa com “Eu nasci sob circunstâncias pouco usuais", e conta a impossível história de um homem que nasce com oitenta anos e regride na sua idade. O filme foca questões sociais, de forma crítica e, de alguma maneira, ajuda-nos a acordar para a vida, ensinando que é uma grande tolice perdemos tempo a pensar no tempo que passa, sem nos lembrarmos de viver o tempo presente. Interessante!

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Mais Balanço Cultural

Já que entrei nessa de balanço cultural, continuei a remexer nas minhas memórias e verifiquei que ando em falta com algumas das boas coisas da vida... como um belo espectáculo musical, por exemplo, ou uma boa peça de teatro.
Mais uma vez, correndo o risco de desiludir a minha "legião de fãs", confesso aqui os meus pecados, e faço votos (para mim própria) de um 2009 mais movimentado nessa área também.
Deveras, a última vez que assisti um espectáculo musical foi quando vi a Marisa Monte no Coliseu de Lisboa, em Setembro de 2006, no seu Universo Particular. Pois é, foi um dos concertos mais bonitos que já tive o prazer de presenciar, e que partilhei com o meu amigo João Alexandre (a quem volto a agradecer – desta vez em público – pela agradável companhia). Marisa Monte apresentou-se num cenário interessante e simples, com recurso a imagens projectadas, luzes e uma composição do palco em degraus que vão e vêm. Este espectáculo foi composto maioritariamente por faixas dos seus dois últimos álbuns, mas não deixou de ter presente músicas gravadas pelos Tribalistas e canções de álbuns mais antigos como a Segue o Seco. A Dança da Solidão e a encenação de Meu Canário, com um canário virtual (ou politicamente correcto, como Marisa o chamou) prenderam, particularmene, a minha atenção.
Quanto ao teatro, aqui também o (meu) verbo está escrito no passado. Uma das últimas peças que vi foi encenada no Teatro FAAP, em São Paulo, em Novembro de 2007, quando aproveitei a minha curta estadia de uma semana para ver Ensina-me a Viver, com Glória Menezes, João Falcão, Ilana Kaplan e Fernanda de Freitas (creio que estou a esquecer de algum nome). Na narrativa, Harold (João Falcão) é um jovem de vinte anos que vive como um idoso, obcecado pela morte, e Maude (Glória Menezes) é uma senhora de quase oitenta anos completamente apaixonada pela vida. A partir do encontro destas duas pessoas tão diferentes, uma trama se desenrola com uma tocante e bem-humorada história de descobertas entre ambos, repleta de mensagens positivas do tipo “o amor é o melhor remédio”, onde o velho rapaz aprende com a jovem senhora sobre o prazer de viver.
Depois disso, e de regresso a Portugal, voltei várias vezes ao teatro (primeiro, no Carlos Alberto, no Porto e depois no Teatro Viriato, em Viseu) ao longo do mês de Fevereiro de 2008 (sozinha e também com diferentes acompanhantes), para ver um único espectáculo: A Invisibilidade das Pequenas Percepções, onde o coreógrafo Romulus Neagu realiza o encontro entre uma pessoa com deficiência, José António Correia, e outra proveniente de um Lar de Infância e Juventude (a Instituição onde, por acaso, sou Directora Técnica), Ana Isabel Gomes (uma menina especial e talentosa). Uma obra de dança contemporânea, onde os três contam as suas histórias através de movimentos corporais que, num crescendo de emoções, não deixam o público indiferente. A completar e acompanhar a composição, a presença do músico Ulrich Mitzlaff, proporciona momentos sonoros únicos.
Por último, em Março de 2008, fui com a minha colega e amiga Anabela ao Teatro Viriato novamente, dessa vez para assistir ao espectáculo Maldoror, dos Mãos Morta, composto a partir de “Os Cantos de Maldoror”, a obra-prima literária de Isidore Ducasse (pseudónimo de Conde de Lautréamont). Um espectáculo único, perturbador, que faz uma crítica provocadora a alguns aspectos da nossa realidade, e onde a música brinca com o teatro, o vídeo e a declamação. A caracterização dos personagens contrastavam com os vídeos, de uma simplicidade infantil, que eram interrompidos quando o narrador utilizava uma mini-câmera para realçar alguns pormenores da peça. Diferente e interessante!

sábado, 10 de janeiro de 2009

As minhas leituras em 2008

As pessoas fazem balanços (do ano, da empresa, da vida, enfim) no final de cada ano... Eu, como boa rebelde que sou, faço-os quando me apetece.
Hoje, fazendo um balanço do que fiz em 2008, portanto, resolvi lembrar da “lista” de livros que li, e... grande vergonha! Afinal, apesar de ter comprado alguns títulos e de me terem presenteado com outros tantos, li apenas 3 livros durante todo o ano! Eu não devia confessar isso aqui, diante de toda a minha grande "legião de fãs", mas é verdade. Nem parece coisa minha... mas enfim... é uma realidade que tenho que aceitar e – se tiver disposição – mudar em 2009.
Falo em disposição porque não acredito na desculpa da falta de tempo. Sempre citei (e assumi como parte da minha filosofia de vida) a frase: “falta de tempo é a desculpa dos que perdem tempo por falta de método”. Acho, por isso, que tudo o que fazemos depende da nossa motivação, da nossa vontade, da nossa disposição.
Não faço promessas (de qualquer natureza), mas espero que em 2009 eu possa ter muita motivação, vontade e disposição para a leitura, mas por enquanto, permitam-me partilhar as minhas 3 leituras de 2008 convosco.
O primeiro livro (Orgias) foi escrito pelo meu querido Luís Fernando Veríssimo. Sou fã, mas não sou cega e, apesar de tudo o que já li (e gostei) dele, não considero Orgias uma obra-prima. De qualquer forma, com o seu toque pessoal bem distinto, ele continua a construir as crónicas com a inteligência e o sarcasmo que sempre o caracterizaram. Com bom humor, Veríssimo passeia pelas tentações e prazeres humanos e afirma que perder o controlo é necessário e saudável. Os seus temas “orgiásticos” vão desde as festinhas de anos infantis, passam pelas festas de final de ano nos escritórios e terminam nas grandes loucuras de carnaval. Deu para passar o tempo.
O segundo livro (Venenos de Deus, Remédios do Diabo), do meu não menos querido Mia Couto, eu amei! Nesta obra, um médico português de nome Sidónio Rosa decide fazer trabalho cooperativo em Moçambique para tentar encontrar a sua querida Deolinda, uma mulata que conheceu num congresso em Lisboa, e por quem se apaixonou. Chega a Vila Cacimba, e encontra os pais da moça – Bartolomeu Sozinho e Dona Munda – que justificam a ausência da filha com um suposto estágio. No decorrer da história, o médico é surpreendido por histórias antagónicas sobre o que terá acontecido a Deolinda e sobre o passado da família Sozinho. Mia sabe contar uma história, e vai doseando a informação, de modo a que personagem e leitor venham a conhecer os factos ao mesmo tempo. A linguagem apresentada é típica em todas as suas obras, com palavras alteradas e provérbios de pura filosofia popular (alguns felizes, outros nem por isso, mas nada que tire o encantamento da narrativa). É, sem dúvida, um livro que envolve.
O terceiro livro (O Vendedor de Passados), do para mim até então desconhecido José Eduardo Agualusa, conta a história de Félix Ventura, um negro albino especialista em reescrever a biografia de personagens da emergente sociedade urbana de Angola, tornando interessante a vida dos novos ricos angolanos, que têm dinheiro e poder, mas aos quais falta um passado consistente. A história é narrada por Eulálio, uma osga que habita a casa de Félix, e que busca na sua passada vida humana (viveu quase um século na “pele de homem sem se sentir inteiramente humano”) indícios de outra encarnação, de modo a compreender as suas emoções e reconhecer os vestígios literários e a sua aguçada percepção. O vendedor de passados mais tarde se apaixona por Ângela Lúcia, fotógrafa “de nuvens” cuja vida se entrelaça à de outras personagens da narrativa, José Buchmann, um fotógrafo de guerra, que procura um novo passado junto a Félix, e o mendigo Edmundo Barata dos Reis, comunista assumido, “ex-agente e ex-gente” nas palavras do próprio. Esta obra mostra um pouco da cultura angolana e representa uma crítica à sua sociedade. A trama toda é muito interessante e o final, inesperado e surpreendente!

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Cupuaçu no Continente!

Sabem quando encontramos um conhecido que não vemos há muito tempo (mas com quem também não temos muitos assuntos) e, no início da conversa, após o tradicional: “— Tu por aqui? Há quanto tempo! Tudo bem?” — surge a pergunta: “— Então, e novidades?”. E lembram qual é a resposta que, invariavelmente, recebemos (desde a propaganda do supermercado Continente)? “— Novidades? Só no Continente…”
Oiço isso há muito tempo cá em Portugal, e bem que procuro por novidades lá no tal Continente quando vou às compras… mas o que encontro é sempre o mesmo (as mesmas marcas, os mesmos preços, os mesmos pseudo-descontos… enfim!).
Por isso, enorme foi a minha surpresa quando, num desses dias, comprovei o que dizem. Não é que encontrei uma grande novidade lá no Continente? Acreditem, porque é verdade! Encontrei polpa de cupuaçu, gente! Não, não estou a inventar. Já havia visto polpa de muitas frutas naquele supermercado: manga, acerola, entre outras, mas cupuaçu... nunca!
E lá estava ela, a pedir que eu a levasse para a casa, preparasse um delicioso creme e um sumo para acompanhar, e saboreasse tudo como quem come um doce pela primeira vez… Hummm! Que delícia!
O cupuaçu é daquelas (muitas) coisas que carregam o sabor da Amazónia. A gente põe uma colher de creme na boca, fecha os olhos e viaja… Eu viajei! Deu para andar na sombra das mangueiras (sob um “ameno” sol de 40°), visitar o Museu Emílio Goeldi, caminhar pela confusão do Ver-o-Peso, passear pela Praça da República, ler um livro tranquilamente no Parque da Residência, dar um saltinho a Mosqueiro, vaguear pela orla de Icoaraci, sentar para ver o rio Guamá da Estação das Docas… Enfim!
A sensação é a mesma descrita na música "Não peguei o Ita", de Nilson Chaves: “Mas ponho na boca um gosto de cupuaçu, meu hálito cruza o país de Norte a Sul… e sinto o prazer de saber que eu sou e o que sou para o mundo”
Xiii! Que nostalgia! Mas é bom…

domingo, 4 de janeiro de 2009

Perguntas sem Respostas

Bem... isso dos anos da Lídia fez-me pensar um bocadinho (mas só um bocadinho, para não acostumar).
Como estarei eu aos 40? O que mudará? Sim, porque não tarda nada (16 de Janeiro) terei 38... Daí para os 40 será um pulo (ou 730 dias, o que dá ao mesmo).
Lembro-me que aos 10/12 anos ficava a imaginar como seria a minha vida quando tivesse 30...
Tudo parecia tão distante, tão remoto, tão inalcançável... e de repente, bum! Vinte anos, 25, 29 e... 30! Não foi mau, pelo contrário. Aprendi bastante, arrisquei o suficiente, descobri sentimentos, conheci lugares, encontrei pessoas, realizei coisas, apurei gostos e paladares, mudei muito...
Aos 29 anos um episódio mostrou-me uma parte dessas mudanças...
Fui convidada, juntamente com outros professores (a maioria já passada dos 40, e apenas uma da mesma idade que eu), para a festa de aniversário (18 anos) de uma aluna de quem todos gostávamos muito. Estávamos em Maputo, e o local escolhido pela menina foi uma casa nocturna de público maioritariamente jovem.
No início, tudo bem, a música não incomodou muito, eu estava a curtir a festa. No entanto, o ritmo (sempre o mesmo) começou, a pouco e pouco, encher os ouvidos (e a paciência). Devo aqui ressaltar que aquele tipo de música não me incomodava antes. Passados trinta minutos de lá estarmos, eu não via a hora da moça soprar as velinhas, de modo a que pudéssemos ir embora. Comentei isso com a Patrícia (a tal “jovem” da mesma idade que eu) e ela disse que estava a sentir o mesmo. Rimo-nos bastente da situação, e dissemos, quase que a sussurrar: "acho que estamos a ficar velhas..."
Confesso que aquela constatação não me incomodou em nada... A sensação era de alívio. Dei-me conta de que estava a apurar mais um gosto...
A aniversariante finalmente fez-nos o favor de cortar o bolo e, ao fim de quinze minutos, estávamos a dançar todos muito animados no “Sixties”, um point da malta madura da cidade.
Mas voltando aos meus futuros (e "longínquos") 40 anos... Como serão? O que vai mudar? O que irei aperfeiçoar desta vez? Deixo as perguntas, porque, definitivamente, não tenho as respostas...

sábado, 3 de janeiro de 2009

40 Anos

A minha amiguinha fez ontem 40 anos de existência! Pois é... ela chegou lá primeiro que eu... E chegou em forma... que forma! Também, verdade seja dita: ela sempre foi pequenininha, não havia muito por onde aumentar, não é? (Mulheres... Mesmo quando elogiam outra, dão um jeito de envenenar um bocadinho!).
Agora a sério, sempre brinquei com o tamanho dela e, todas as vezes que eu lhe dizia que os pais quando a fizeram estavam a testar o protótipo para depois executar a obra verdadeira (o irmão), ela respondia:
– Nada disso! Não sou pequena, sou concentradinha nas devidas proporções!
Ela é que está certa! Alegre, bem disposta, às vezes birrenta, mas sempre de bem com a vida! Felicidades, Lídia!