domingo, 21 de dezembro de 2008

Um Gesto Natural

Pergunto-me com frequência, porque será que na altura do Natal as pessoas ficam, de repente, tão caridosas, tão solidárias.
Sim, é verdade! A generalidade das pessoas não se lembra que existem crianças, jovens e adultos, deficientes, doentes ou a sofrer de outro mal ao longo do ano. Parece que Dezembro é o mês do sofrimento. E é o mês de mostrar que fazem qualquer coisa pelo próximo, quando mais não seja juntar os velhos brinquedos (alguns até partidos e, consequentemente, sem qualquer utilidade) que os filhos já não querem mais, para dar a crianças carentes, quase como a dizer que, por serem necessitadas, não merecem coisas inteiras.
Aqui impõem-se outras questões: Porque as pessoas confundem estes gestos com caridade e amor ao próximo? Porque as pessoas pensam que, ao chegar a noite de Natal, podem ir a um orfanato ou a um lar onde haja uma criança afastada da família por alguma razão, e levar essa criança para a casa, assim, sem mais nem menos, sem qualquer vínculo estabelecido, sem qualquer laço de afecto, e acham que estão a fazer um bem? Porque as pessoas não fazem pequenos gestos o ano inteiro, não criam laços e compromissos para que, na altura do Natal, o acto de dar possa ser visto e sentido como mais natural?
Matilde Rosa Araújo, escritora e professora, nascida em Lisboa em 1921, cuja voz tive a felicidade de ouvir recentemente numa tertúlia organizada pelo Solar do Vinho do Dão, em Viseu, oferece-nos algumas lições nos seus escritos e, a propósito daquilo a que chamamos caridade, no final do seu conto “A fita vermelha”, ela deixa um conselho: “... não adiem os vossos gestos. Procurar alguém que sofra, que precise de nós, nem sequer é um gesto generoso, deve ser um gesto natural, que se não adia.”

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