domingo, 14 de dezembro de 2008

O Carteiro

"Quando o carteiro chegou e o meu nome gritou com a carta na mão (…) nem sei como pude chegar ao portão…"
A emoção reflectida nesta letra de Cícero Nunes e Aldo Cabral é a mesma que eu sentia, quando era adolescente, cada vez que ia à caixa de correio e via que tinha uma carta para mim.
O advento da internet veio mudar essa sensação, já que hoje uma carta (ou, nesse caso, um e-mail) pode levar menos de um minuto a chegar ao seu destino. Vejam bem, não tenho nada contra a internet (não teria eu um blogue), mas sinto uma grande nostalgia quando lembro daquela época.
Antes mesmo da existência da internet, eu já tinha amigas virtuais. Sim, daquelas que eu só conhecia por carta. Encontrava-as nos jornaizinhos dos grupos de bandeirantes e escoteiros que eu participava ou nas revistas de banda desenhada, que destinavam um espaço para quem quisesse fazer amigos à distância. E costumava “falar” com as minhas amigas virtuais através das cartas como se as conhecesse pessoalmente.
Eu tinha um bloco de cartas, aliás, mais do que um… alguns tinham folhas com desenhos e frases de rodapé… outras eram perfumadas, para as missivas mais delicadas.
Escrevia à mão, claro, já que as mensagens escritas à máquina eram tidas como muito impessoais. No início, dada a falta de experiência, costumava fazer um rascunho da carta, para depois passar para o papel definitivo, sem rasuras. Com o tempo, passei a escrever directamente no papel de carta (já sem qualquer erro). Raramente mandava uma folha só… muitas vezes parecia um livro, tantas eram as páginas escritas, tantas eram as novidades a relatar!
Subscritava carinhosamente o envelope (que podia ter várias cores, tamanhos e formatos), levava-o ao correio mais próximo, onde comprava um selo (muitas vezes mais que um, dado o peso do pacote), e depositava-o na caixa. Depois, esperava, esperava, esperava pela resposta… e, quando ela chegava, abria o envelope com muito cuidado, e lia as novidades avidamente.
Porque tanto trabalho para abrir um simples envelope? Porque eu sabia que lá bem distante, noutra cidade ou noutro país, alguém o havia subscritado com carinho, tal como eu fazia. Alguns até tinham o perfume das mãos de quem o tinha tocado... Pois é, a carta continha, para além da emoção das novidades, um cheiro, uma textura, uma forma...
O carteiro, naquela altura, fazia parte do meu dia-a-dia, do meu imaginário, dos meus sonhos... Mas hoje, infelizmente, sinto que aquela figura mística do "carteiro que surpreende" está em extinção.
Hoje, o carteiro é mensageiro, na maior parte das vezes, de correspondências que saem da caixa de correio directamente para o lixo. Já não trás novidades, não trás emoção. Já ninguém o espera passar, ninguém pergunta por ele...
Agora, na maioria das vezes, ele caminha quilómetros de distância para fazer entregas que já não comovem…

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